Metodologia, memória e reprodutibilidade: o papel da ciência aberta na Paleoecologia
- Thamyres Sabrina Gonçalves
- 22 de ago.
- 3 min de leitura
Atualizado: 26 de ago.
A perspectiva de uma embaixadora da Rede Brasileira de Reprodutibilidade sobre ciência aberta e reprodutível na sua área de estudo.

Reconstituir paisagens é uma forma meio mágica de fazer ciência, é acessar o passado através de pedacinhos do presente, é estar presente no passado com a chave do futuro, é bem legal trabalhar com pesquisa em reconstituição paleoambiental. A diversidade bate a nossa porta o tempo todo, em tudo, não há como falar de natureza sem diversidade, e por isso dá pra acessar esse passado da reconstituição das paisagens por várias portas diferentes, pra mim esses pedacinhos de passado que a gente acessa no presente são como portinhas, que as vezes te levam mais perto, ali mesmo no Holoceno, as vezes mais longe, lá no início do Pleistoceno, alguns levam mais longe ainda, pra trás do Quaternário. No nosso linguajar teórico chamamos isso de proxies, ou marcadores, isso pode ser sobre grãos de pólen, fitólitos, grãos de amido, vestígios de folhas, frutos, sementes, ou microfragmentos de carvão que já foram uma árvore. Na medida em que a vida vai acontecendo ela vai deixando rastros, vestígios, é a verdadeira memória ancestral, a memória da terra, e nós os cientistas, vamos seguindo as pistas para tentar reconstituir como foram essas paisagens que fizeram parte da história da terra em que vivemos, é como montar um quebra-cabeças, só que obviamente tem métodos, afinal é na metodologia científica que se apoia o fazer ciência do nosso tempo, felizmente. É ai que entra a questão da reprodutibilidade... acho que quando a gente faz pesquisa em reconstituição de paleoambientes, estamos tão empolgados com o que vamos descobrir, com o que aqueles pedacinhos do quebra-cabeças tem a nos contar sobre a história, que mal nos lembramos de preocupar com a reprodutibilidade das nossas pesquisas, ou seja, com a possibilidade de que outros pesquisadores consigam replicar a metodologia que usamos, não estou tratando de nenhum tipo de quebra de patentes ou qualquer propriedade intelectual, estou falando da possibilidade de descobertas que possa ir além do caderninho de campo de um único pesquisador que desenvolveu determinada pesquisa, isso é muito importante. Ao reconstituir paisagens, frequentemente estamos lidando com um grau de subjetividade considerável nos nossos dados, seja por não serem estes de distribuição normal de acordo com os padrões da estatística, ou porque as condições específicas do material de estudo às vezes demandam tantas adaptações metodológicas que acabamos criando um novo protocolo de análise. Cada área de pesquisa tem suas questões específicas, e ao meu ver não há como zerar a subjetividade na pesquisa paleoambiental, afinal trata-se de acessar um passado através de vestígios, às vezes microscópicos. Ainda assim, é importante falar de uma ciência que possa e deva ser reprodutível, que possa ser replicada, porque isso é falar de uma ciência transparente, democrática, justa, honesta. Foi para aprender e propagar mais sobre isso que me dispus a ser embaixadora da Rede Brasileira de Reprodutibilidade. Gostaria de convidar a todos vocês, meus colegas pesquisadores das áreas paleoambiental, arqueobotânica, paleobotânica, paleoecológica, a conhecerem o trabalho e os princípios da Rede Brasileira de Reprodutibilidade. E, por falar em ciência aberta, vou deixar como sugestão de leitura um artigo científico onde eu fiz um levantamento de todas as espécies nativas da flora brasileira que já foram objeto de publicações no Journal of Seed Science, e também alguns links de metadados na área de reconstituição paleoambiental.
Sugestão de leitura:
GONÇALVES, T.S. and VELOSO, M.D.M. The research effort on seeds of plant species native to the Brazilian flora. Bioscience Journal. 2022, 38, e38081. https://doi.org/10.14393/BJ-v38n0a2022-55923
Sugestões de sites:
Rede de Catálogos Polínicos online - https://rcpol.mn.ufrj.br/pt/home/
Sociedade Internacional de Fitólitos - https://phytoliths.org/
Paleoetnobotânica e Projeto de Banco de Dados de Grãos de Amido - https://clarissacagnato.weebly.com/
Bancos de Dados - Patrimônio Arqueológico - http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1701/
Bancos de Dados de Plantas - https://leap.ufsc.br/bd/
Laboratório de Arqueobotânica e Paisagem, Museu Nacional, UFRJ - https://lap.mn.ufrj.br/
Mais sobre a autora:
Thamyres Sabrina Gonçalves é Geógrafa, com Mestrado na Engenharia Florestal e Doutorado em Agronomia. Uma pesquisadora de descendência indígena e quilombola que atualmente é bolsista como Jovem Pesquisadora Fluminense pela Chamada conjunta FAPERJ-Serrapilheira em Ecologia para Jovens Cientistas Negros e Indígenas. Mãe de uma linda menininha. Em busca de um mundo com mais mulheres na ciência e de uma ciência mais aberta e colaborativa.
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